Primeiro, muitos analistas econômicos achavam que o Banco Central iria puxar os
juros para colocar já as expectativas do mercado financeiro em 4,5% ao fim de
2016. Agora, as queixas são de que a autoridade monetária vai abandonar as
expectativas de inflação à própria sorte. Não é nada disso.
O BC segue a
condução clássica do regime de metas de inflação. Ou seja, está mirando a
inflação em 4,5% ao fim de 2016, segundo seus próprios modelos, adotando um
balanço de riscos conservador para chegar lá.
A expectativa de inflação faz parte dessa equação porque é um dos
mecanismos de transmissão da política
monetária, e também um dos componentes com grande peso nos modelos de
projeção do BC. Domá-la faz parte da tarefa de levar a inflação ao centro da
meta, e a sua ancoragem deve ser feita ao longo do caminho que leva a inflação
a 4,5%.
A confusão no mercado financeiro sobre os reais propósitos da política monetária surgiu há
alguma semanas, quando o BC indicou que tem os objetivos de: circunscrever os
ajustes de preços relativos (alta do dólar e reajuste de preços administrados)
a 2015; fazer a inflação chegar à meta de 4,5% ao fim de 2016; e ancorar as
expectativas do mercado em 4,5% ao fim de 2016.
Alguns analistas econômicos entenderam a mensagem do BC como uma determinação de, por
meio de altas mais fortes de juros neste momento, colocar as expectativas do
mercado, hoje em 5,5%, em 4,5% ao fim de 2016. Ou seja, um entendimento de que
o objetivo principal da política
monetária é domar as expectativas de inflação do mercado.
Na edição do Valor de quarta-feira, o jornalista Cristiano Romero
esclareceu que, na verdade, o BC mira
a inflação por meio do que dizem os seus modelos. Ou seja, no curto prazo, vai
subir os juros até que as projeções de seu modelo apontem 4,5%. Não poderia ser
diferente num regime de "inflation forecast targeting" (meta de
inflação projetada, em tradução livre).
A essas considerações, pode se acrescentar que, dentro dessa tarefa, o BC vai operar com um balanço de
riscos conservador. E vai ajustar a condução da política monetária aos eventuais desvios da inflação
projetada à meta que surjam nessa jornada.
Estamos a 17 meses de dezembro de 2016, prazo que o BC determinou como
final para colocar a inflação na meta. No Brasil, os efeitos da política monetária se transmitem
relativamente rápido para os preços, em cerca de três trimestres. Há, portanto,
tempo hábil para reagir a desdobramentos desfavoráveis em relação aos previstos
nas projeções do BC e garantir a convergência da inflação para 4,5% ao fim de
2016.
Talvez seja por isso que, na sua comunicação, o BC tem deixado relativamente em aberto
os seus passos futuros e tem sido paciente em não decretar um fim prematuro do
ciclo de alta.
Uma leitura que surgiu desde quarta é que, ao reafirmar que mira a
inflação com a lupa de seus modelos, o BC abandonou o objetivo de ancorar as expectativas no centro
da meta de 4,5% em 2016. Outro entendimento é que teria baixado a guarda na sua
indicação de vigilância. Mas não houve mudança na comunicação.
O objetivo de ancorar as expectativas segue válido, assim como o de
circunscrever os ajustes de preços relativos a este ano. Mas são objetivos
indiretos da política monetária,
que na essência são impossíveis de se dissociar do próprio objetivo maior de
colocar a inflação no centro da meta em 2016.
As palavras-chaves no caso do ancoramento das expectativas são
paciência, perseverança, determinação, que farão com que elas convirjam para
4,5% ao longo do tempo.
Quem estudou o comportamento das expectativas mais a fundo sabe que elas
dependem de uma série de fatores. São afetadas por uma certa inércia, pela
inflação corrente e até, nos estudos de economia comportamental, o chamado
"group thinking", que é uma visão homogênea que naturalmente costumam
ter especialistas que convivem entre si e discutem os mesmos temas.
Ou seja, a queda da inflação corrente tende a puxar as expectativas para
baixo, e a inércia vai se diluindo ao longo do tempo. Comunicação ajuda a
oxigenar o debate.
Nada disso quer dizer que a política
monetária esteja abrindo mão de fazer a expectativa de inflação ir
para o centro da meta. A política
monetária afeta as expectativas. As expectativas são um dos canais
de transmissão dos juros. Elas são um componente com forte peso nas projeções
do BC. Como estão acima da meta, exigem mais da política monetária.
O ancoramento das expectativas, na essência, representa um compromisso
assumido pelo BC num
caminho mais longo que os meses mais imediatos. Significa colocar as projeções
de inflação do BC na meta e reagir a desvios negativos nessas mesmas projeções.
E, seguramente, quando for a hora de baixar os juros (debate que o BC acha hoje
despropositado), as expectativas ancoradas seguramente serão um fator
importante na tomada dessa decisão.
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