Wednesday, May 27, 2015

Bancos propõem incentivos a crédito privado de longo prazo

Da criação de um novo título de captação bancária a novos estímulos ao mercado de capitais, os bancos discutem com o governo uma série de medidas de estímulo ao financiamento de longo prazo da economia. O principal objetivo é encontrar fontes alternativas ao BNDES e, do lado do governo, criar uma agenda positiva para a retomada dos investimentos em meio ao cenário de retração da atividade e da necessidade de ajuste fiscal.
Uma das propostas levadas pelos bancos foi a criação da "letra de investimento", um instrumento semelhante às letras de crédito imobiliário (LCI) e do agronegócio (LCA), mas com lastro em financiamentos destinados a projetos de investimento.
Para atrair o investidor, a nova letra teria isenção de imposto de renda e não estaria sujeita ao recolhimento do compulsório no Banco Central. Em contrapartida, os papéis precisariam ter prazo mínimo de três anos e sem possibilidade de recompra antes do vencimento, de acordo com a proposta à qual o Valor teve acesso.
O incentivo fiscal ajudaria a atacar dois dos principais entraves para o financiamento privado: o custo alto e o prazo relativamente curto do funding bancário em comparação com as linhas subsidiadas do BNDES. Com a nova letra, as instituições conseguiriam emprestar os recursos a uma taxa atrativa e, ao mesmo tempo, "casada" com o prazo de maturação dos projetos financiados.
O objetivo é que o novo título de captação preencha uma lacuna no financiamento durante a fase de construção dos empreendimentos, considerada mais arriscada. Em vez de correr o risco direto do projeto, o investidor da letra ficaria exposto ao risco do banco emissor do papel, como se tivesse aplicado em um CDB tradicional.
A criação do novo título de captação, que depende de lei específica, é apenas uma das iniciativas em discussão. O tema vem sendo tratado por entidades que representam os bancos, como a Anbima e a Febraban, em interlocução frequente com o governo. A expectativa é que a agenda avance tão logo o governo consiga deixar para trás a aprovação das medidas de ajuste fiscal. As condições de financiamento são fundamentais para viabilizar, por exemplo, o novo programa de concessões em preparação pelo governo.
Uma alternativa mais imediata à criação da letra bancária é a liberação de parte do compulsório retido no Banco Central. Os recursos poderiam ser usados para os chamados "empréstimos-ponte", linhas de curto prazo concedidas enquanto o financiamento definitivo não sai.
A medida conta com a vantagem de não representar renúncia fiscal e seria um estímulo adicional para que os bancos comerciais topassem o risco de financiar os projetos em seu momento mais crítico. A liberação dos recursos, contudo, não encontra simpatia no Banco Central e não chegou a ser incluída na proposta da Febraban, segundo o executivo de um banco, que pediu para não ser identificado.
Como o balanço das instituições financeiras é limitado, as medidas propostas pelo setor privado passam também pelo estímulo ao mercado de capitais. Uma das ideias é oferecer garantias aos investidores que comprarem títulos de dívida de projetos em fase pré-operacional. As debêntures emitidas para financiar obras de infraestrutura já contam desde 2011 com isenção fiscal para pessoas físicas e investidores estrangeiros.
Em caso de atraso ou outro problema que prejudique o fluxo de caixa do projeto, as instituições que concederam o aval arcam com o pagamento de juros aos investidores. Os bancos já testaram esse mecanismo em algumas operações e o próprio BNDES já sinalizou que pretende oferecer esse tipo de garantia para as empresas que captarem recursos no mercado de capitais.
Os bancos também querem que o governo autorize a captação de recursos pelas empresas com a emissão de debêntures de concessões mais maduras - e, portanto, com menos risco para o investidor - para financiar novas obras. A emissão também seria usada para pré-pagar empréstimos do BNDES, o que contribuiria para reforçar o caixa do banco.
A Anbima também já encaminhou ao governo uma série de sugestões para destravar o financiamento privado. A associação divulgou ontem um relatório que traz uma compilação de todas as propostas encaminhadas nos últimos anos.
Em conjunto com o BNDES, a Anbima anunciou o plano de vincular a concessão de crédito ao custo de TJLP, atualmente em 6% ao ano, à captação uma parcela dos recursos no mercado de capitais. "A medida deve ter um efeito multiplicador dos recursos do banco", afirma Eduardo Muller Borges, diretor da área de mercado de crédito internacional e local do Santander.
Borges não comentou sobre novas medidas, mas diz que a redução do espaço do BNDES, com a maior participação do setor privado no financiamento de longo prazo, é positiva, desde que as regras para os empréstimos aos projetos já aprovados sejam mantidas.
Enquanto novas medidas de estímulo não saem, o mercado começa aos poucos a ganhar tração. "O movimento não chegou a parar, mas só recentemente voltaram a aparecer solicitações para emissões de debêntures de infraestrutura", afirma o advogado Ricardo Simões Russo, do escritório Pinheiro Neto.
Entre as medidas para incentivar o financiamento de longo prazo via mercado, o advogado citou uma já existente, regulamentada no ano passado pelo Banco Central: a oferta no exterior de certificados com lastro em debêntures emitidas no Brasil, conhecidos como depositary receipts (DR). Embora o instrumento esteja pronto, ainda depende da definição de questões fiscais, segundo Russo.

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